Incompetência dos governos perpetua desigualdades no Brasil (Parte 1) - Rede Gazeta de Comunicação

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Incompetência dos governos perpetua desigualdades no Brasil (Parte 1)

SAMUEL HANAN

Engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário, e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002)

Está na Constituição, logo em seu artigo 3º, que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Lamentavelmente, o Brasil ainda está longe de cumprir a ordem constitucional expressa nesses quatro incisivos que visam, ao final, garantir a todos os brasileiros a condição de verdadeiros cidadãos, com os mesmos direitos, as mesmas oportunidades e possibilidade de vida digna.

Esse princípio fundamental fica limitado ao papel porque o país se mostra incapaz de superar – ou ao menos de reduzir drasticamente – as desigualdades, essas a maior barreira para a construção de uma sociedade verdadeiramente justa.

Poderia ser diferente, se nossos governos enxergassem as atrofias demográficas e econômicas escancaradas pela realidade nacional. Uma rápida análise dos indicadores mostra que São Paulo, com área territorial 30,59 vezes menor que a da soma dos 16 estados das regiões Norte e Nordeste, abriga 21,16% da população brasileira (ante 38,11% do Norte e Nordeste somados), e tem PIB 59% maior que o dos estados daquelas duas regiões. Essa distorção é confirmada pelos números relativos aos sete estados da região Sul e Sudeste, com área 5,07 vezes menor que a dos estados do Norte e Nordeste, população 42,46% maior e PIB 253,27% superior. O Brasil, portanto, está torto e essa situação pode comprometer a segurança nacional e a integridade territorial.

As atrofias sociais também são significativas. A concentração de riquezas é brutal. Em 1960, os brasileiros que compunham a faixa dos 1% mais ricos participavam com 12,10% da renda nacional. Em 61 anos, essa participação mais que dobrou, chegando a 26,60% em 2021. Há dois anos, os 50% mais pobres detinham apenas 10% da renda nacional! Ao longo das décadas, os brasileiros estão empobrecendo, com a classe média minguando e os pobres se aproximando cada vez mais da linha da miséria. A pandemia da Covid-19 agravou o quadro: em 2021, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas, 62,9 milhões de brasileiros (29,6% da população total) vivia com renda domiciliar per capita de até R$ 497,00 mensais. Nada menos do que 9,6 milhões de brasileiros passaram a integrar o grupo dos que vivem em situação de pobreza.

Quadro trágico que levou à necessidade de socorros emergenciais de distribuição de renda, sem, entretanto, buscar-se solução para a raiz do problema. Impossível aprovar qualquer governo das últimas três décadas se o País não foi capaz de erradicar a miséria e a fome, apesar das grandes riquezas nacionais.

Como se não bastasse, os indicadores internacionais evidenciam as atrofias sociais brasileiras. Os resultados das duas últimas décadas são desanimadores. No ranking mundial do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o Brasil ocupava a 71ª posição em 2002, caiu para a 88º colocação em 2010 e estava em 84º lugar em 2020. No Coeficiente Gini, que mede desigualdades, escolaridade, renda e oportunidades, o país oscilou entre a 6ª e a 8ª piores posições no período. Nesses 20 anos, segundo critérios do IRBES, que mede o retorno em serviços oferecidos à população dos recursos dos tributos arrecadados, o Brasil ficou estagnado na 30ª posição entre as nações mais desenvolvidas, apesar de ter a 13ª maior carga tributária mundial. Amargamos também os piores conceitos no PISA, o programa internacional de avaliação de alunos desenvolvido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Entre 79 países avaliados, o Brasil ocupa apenas o 60º lugar em leitura, oscila entre o 72º e 74º em matemática e fica entre a 66ª e 68ª posição em ciências.

Essa situação, por certo, não é obra de um dia e tampouco de um único governo. Ao longo de décadas, foram se somando medidas equivocadas, fruto da ausência de visão estratégica, falta de planejamento, decisões imediatistas e de atos contaminados por interesses eleitoreiros. Um dos maiores erros, ainda vigente, é a tributação excessiva sobre o consumo (de 44 a 46% do total das Receitas Tributárias dos 3 entes Federativos), o dobro da tributação sobre capital e renda (de 20 a 21%), exatamente o contrário do que acontece, por exemplo, nos Estados Unidos, a maior economia do mundo. O Brasil adotou um modelo perverso e regressivo, que penaliza as classes menos favorecidas, obrigado o cidadão a pagar 25% de imposto sobre alimentação, de 35 a 38% sobre itens de higiene pessoal e limpeza, de 40 a 49% sobre vestuário, e de 36 a 38% sobre produtos industrializados de alimentação.