Fundamentalismo supremo (Parte 2) - Rede Gazeta de Comunicação

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Fundamentalismo supremo (Parte 2)

CÁSSIO FAEDDO

Advogado, mestre em Direito e MBA em Relações Internacionais – FGV/SP

(…) deve-se tolerar todas (religiões) as que se mostram tolerantes com as outras desde que seus dogmas nada tenham de contrário aos deveres do cidadão. Mas quem quer que ouse dizer: Fora da Igreja não há salvação, deve ser banido do Estado, a menos que o Estado seja a Igreja, e o príncipe, o pontífice. Tal dogma só pode ser útil num governo teocrático; em qualquer outro, é pernicioso.

De forma sintética, diverge o sistema romano-germânico, com leis nascidas de uma vontade política delegada pelo povo, do sistema do islã, naqueles países onde prevalece a Xaria.

Na Xaria, o núcleo se concentra na religião, com regras constantes do Corão e da Suna, relatos acerca das falas e atos de Maomé, compilados pelos doutores do Islã.

Temos na Xaria, um “direito revelado”, não tendo nenhuma autoridade qualquer ser humano que queira modificá-lo. Nisto se distingue também do Direito Canônico, pois neste há atuação de uma autoridade eclesiástica.

Porém, nas democracias ocidentais, há clara separação da influência de leis da igreja e aquelas de delegação do povo;  Tomás de Aquino, afastou o conceito do processo medieval inquisitório promovidos pela Igreja Romana por meio dos padres da Inquisição.

Pois bem.

O artigo 101 da Constituição determina que o “Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. ” A nomeação será do Presidente da República após aprovação pela maioria absoluta do senado.

Os critérios para indicação são poucos, alguns de ordem objetiva outros de ordem subjetiva.

O critério de notável saber jurídico deveria ter relação com as obras jurídicas publicadas, bem como artigos científicos. Porém, há tempos que o único critério é político.

Se o critério é político, por obviedade, não se pode jamais reclamar posteriormente de decisões políticas. Pura hipocrisia de quem o faz.

Não é sem razão que recentemente passamos a acompanhar citações bíblicas em sustentações orais no STF.

Mas não parou por aí.

Temos que a alardeada indicação de um ministro para o STF, tendo como critério ser “terrivelmente evangélico”, é inconstitucional na raiz, pois se trata de uma afronta ao Estado Democrático de Direito e contrária a toda milenar construção histórica/jurídica/ filosófica do Direito.

Um juiz pode possuir religião, mas a religião não pode possuir o juiz. É o que dois mil anos de história nos ensina.

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