Viéses que ocultam talentos - Rede Gazeta de Comunicação

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Viéses que ocultam talentos

JUNIA MARIA DE SOUSA LIMA GALVÃO

Diretora-executiva de Administração e Desenvolvimento Humano da MRV

É muito comum as pessoas presumirem que não são aptas, ou não têm vocação, para exercer certas funções, com base em meros pré-julgamentos, quase sempre resultantes de vieses inconscientes. Ou seja, de opiniões que emergem de forma irracional, sem consentirmos, assimiladas por questões culturais, muito associadas às nossas experiências passadas e ambientes de vida.

Quando se trata de profissão, aliás, é muito instintivo lembrarmos daqueles ‘antigos ensinamentos’ que nos faziam crer que: “isso é coisa para homem”; “isso é coisa para mulher”. E por aí, dessa forma, eram ditados os padrões de comportamento considerados ‘desejáveis’ à época.

Esse tempo, ainda bem, já passou. Mas é certo os vieses permanecem arraigados em nossas mentes e, no contexto atual, são altamente nocivos à geração de empregos e à promoção da diversidade no mercado de trabalho. Isso porque, eles nos autossabotam em termos profissionais; inviabilizam possíveis carreiras, inibem a descoberta de talentos e de novas vocações profissionais.

Um exemplo emblemático está na construção civil, um dos setores que mais emprega trabalhadores em todo o país, mas que até hoje carece enormemente de mão de obra feminina. Os dados oficiais mais recentes apontam que as mulheres representam apenas 9,9% da força de trabalho do segmento. Mesmo nas posições de chefia/liderança, assim como nas atividades que não requerem preparo físico, elas são a minoria da minoria.

Uma constatação preocupante, ainda mais se levado em conta que o país vive uma crise global, que castiga especialmente as trabalhadoras. Atualmente a população feminina alcança 17,9% da mão de obra desempregada no Brasil – cerca de 8,5 milhões de pessoas. O percentual é bem acima da população masculina, que é de 11% – cerca de 5,5 milhões de pessoas.

Neste cenário, a Construção Civil se destaca como um grande polo de oportunidades às mulheres que desejam ingressar (ou também reingressar) ao mercado de trabalho formal e, sobretudo, investir em uma carreira promissora. Sozinho, o setor emprega atualmente 2,48 milhões de pessoas no Brasil (IBGE/set. 2021). A cada ano, em média, são 200 mil novas contratações, em centenas de funções, de qualificações das mais variadas.

Como representante do segmento há quase 20 anos e atualmente diretora-executiva da maior empresa da construção da América Latina, posso afirmar que há uma enorme disposição em valorizar a contratação de mão-de-obra feminina, nas mais diversas atividades que compõem a nossa cadeia produtiva. As empresas reconhecem a necessidade de melhor estruturar suas relações sociais, em busca de um ambiente mais plural e diverso. Muitas, aliás, já percebem o quanto ela impacta positivamente nas suas operações e investem em programas focados nesse público.

Essa disposição, no entanto, muitas vezes esbarra nesses vieses que dificultam a promoção de um ambiente mais equânime. Nesse sentido, o trabalho realizado por algumas organizações do terceiro setor, como a ONG Mulheres em Construção, tem sido fundamental para reverter esse quadro. Apenas por meio dessa entidade, mais de 5 mil mulheres já receberam formação para atuar em diversas áreas da construção, através de cursos e oficinas gratuitas.