Sabemos de fato o que é biodiversidade? (Parte 2) - Rede Gazeta de Comunicação
Sabemos de fato o que é biodiversidade? (Parte 2)

REUBER BRANDÃO

Membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor de Manejo de Fauna e de Áreas Silvestres na Universidade de Brasília

A informação biológica está organizada na natureza, compreendendo um arranjo complexo que envolve diferentes níveis e grandezas. Toda a expressão de vida no planeta contém essa complexidade de organização, seja ela a referência contida em uma pequena sequência de DNA e RNA até todo o conjunto dos componentes vivos de um ecossistema, que chamamos de biota. Desta forma, dizer que biodiversidade se refere a toda a vida da terra ou que é a variedade de formas de vida é extremamente simplório e, por que não, terrivelmente errôneo, pois não informa o pilar crítico do conceito que é a organização da manifestação da vida e os processos ecológicos relacionados.

Devemos considerar processos ecológicos essenciais para a geração e a manutenção da biodiversidade, como as interações ecológicas, a seleção natural e os ciclos biogeoquímicos, como parte da biodiversidade. O conceito precisa incorporar a importância hierárquica da organização da vida. Com isso, quem e quantos são esses componentes (composição), de que forma estão organizados (estrutura) e como interagem entre si e com o ambiente (função) são compreensões essenciais no entendimento do conceito de biodiversidade.

Essa visão mais ampla é fundamental, pois frequentemente os gestores públicos consideram apenas a composição da biodiversidade na elaboração de políticas públicas, deixando de lado a estrutura e a função na natureza. Sem observar a organização hierárquica da complexidade biológica em genes, espécies, populações, comunidades, ecossistemas e biomas, bem como dos processos e estruturas existentes, a compreensão da biodiversidade fica comprometida.

A mutação em um gene que expressa uma característica positivamente herdada irá interferir na seleção da espécie, que por sua vez irá influenciar na composição de outras espécies, levando a mudanças nos ecossistemas e assim por diante. Da mesma forma, mudanças nas paisagens, como a retirada de florestas, afetarão a diversidade de genes presentes nessa região.

Em todo o ciclo da vida há transferência de massa e energia entre os processos biológicos e isso faz com que a compreensão sobre a biodiversidade não seja estática, mas sim uma engrenagem em constante movimento. E é esse movimento que gera as propriedades emergentes dos ecossistemas, dentre os quais os serviços ecossistêmicos que possibilitam a nossa sobrevivência no planeta. Até mesmo a evolução é parte do funcionamento do maquinário da biodiversidade.

As diferenças na história evolutiva e na ecologia dos ecossistemas acabam gerando interessantes processos na estruturação da biodiversidade, que tem sido foco de diversos estudos sobre a forma como a vida se manifesta e atua no planeta. Desde sempre os seres humanos utilizam elementos da biodiversidade, influenciam e até atuam como força seletiva dessa estrutura. Entretanto, o aumento na escala de impacto da atuação humana apresenta novos desafios à natureza, bem como a necessidade de entender melhor a forma na qual a vida humana se inter relaciona com a vida não-humana.

Portanto, quando falamos em biodiversidade precisamos levar em conta o estudo das relações evolutivas entre grupos de organismos, a filogenética; o processo de descrição da diversidade dos seres vivos, a taxonomia; e a interação das espécies com o ambiente. Sem compreender essa engrenagem complexa continuaremos a ouvir o galo cantar, mas não saberemos onde.

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