GIRLENO ALENCAR
A revista do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas enfatiza na sua ultima edição a Trilha do Transespinhaço, que corta 15 municípios do Norte de Minas, começando por Espinosa e terminando em Olhos d’Água. A publicação assinada por Paulo Barcalla salienta que o Espinhaço é a única cadeia de montanhas em solo brasileiro a merecer a designação de cordilheira. Com mais de cerca de 1, 5 mil de extensão e entre 50 e 100 km de largura, rasga o interior do país desde a região central mineira até quase a divisa da Bahia com Pernambuco.
Pontilhado de picos agudos como o do Sol, na Serra do Caraça (2.072 metros acima do nível do mar), o do Itambé (2.052 metros), próximo ao município do Serro, ou o do Itacolomi (1.772 metros), marco da antiga Vila Rica de Ouro Preto, ostenta paisagens grandiosas. Perde-se a conta das dezenas de cachoeiras e rios exuberantes, espetáculo particular da profusão de águas que faz do maciço o manancial das principais bacias hidrográficas que correm para o Atlântico.
No entrecorte de vales profundos, grutas e cavernas guardam vestígios de tempos imemoriais. Ponto de encontro de Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga, carrega em suas alturas uma flora endêmica, com espécies que só ali se desenvolvem e o distinguem do resto do mundo, nos vastos Campos Rupestres, ecossistema extremamente frágil, singular e complexo. Os estudos florísticos atuais estimam que existam entre 2 mil e 3 mil espécies, das quais cerca de 350 ameaçadas de extinção. Em poucas palavras, para além da intensa beleza, a Cordilheira é guardiã da biodiversidade nacional.
Conexão pela trilha
“Endemismo sem tamanho, a necessidade muito grande de conservação, as riquezas, a flora endêmica, a espeleologia, altitudes, água, cachoeiras, culturas, história, comunidades tradicionais, arqueologia”: esse conjunto de atributos despertou a ideia de criação da Trilha Transespinhaço (TESP), inicialmente contida no território mineiro, abrangendo 53 áreas protegidas e 42 municípios. Quem explica os objetivos é Giselle Melo, coordenadora geral da Comissão Provisória da Trilha: “resgate histórico-cultural, geração de renda e conservação ambiental, que depende da interação com a natureza e os valores locais”.
O professor Hebert Salgado, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), doutor em Geografia e parceiro do projeto, confirma o valor imenso, que vai além – e vem de antes – da Minas colonial, da corrida do ouro e dos tropeiros: “Temos lá muitos testemunhos arqueológicos, sítios com painéis de pintura rupestre. O Laboratório de Arqueologia e Estudo da Paisagem da UFVJM (LAEP) está estudando esse patrimônio”.
A TESP foi oficialmente criada em 2018, no “1º Seminário da Trilha de Longo Curso Mineira Transespinhaço”, realizado no Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (IGC/UFMG
A academia se junta ao projeto. “Falamos de um universo multidisciplinar e multidimensional” diz Salgado, também vice-presidente da Rede Brasileira de Observatórios de Turismo. As “universidades [UFVJM, UFMG e PUC Minas] colaboram para olhar os conflitos e as complexidades, mas também para revelar o potencial, valorizar a imagem, auxiliar a planejar e produzir dados”.
É uma “relação institucional com trabalho de pesquisa vinculado”, continua. A Trilha é “ferramenta de conservação; opção de lazer e saúde e, pelo potencial turístico e esportivo, instrumento de geração de emprego, renda e desenvolvimento”. As trilhas de longo curso cumprem papel de grande importância nas três vertentes”, assegura.
Giselle Melo, que é engenheira de produção com mestrado em Meio Ambiente, dá o estado da arte: “Estamos em pleno desenvolvimento da Trilha, uma iniciativa da sociedade civil com órgãos de governo, universidades e comunidades, e temos projeto aprovado no âmbito do Plano de Ação Territorial – PAT Espinhaço (parte do Programa Pró-Espécies, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima – MMA)”. Os Subcomitês do CBH Rio das Velhas também têm sido espaços de discussão sobre a iniciativa
O amor pela natureza e pelas caminhadas começou cedo para Melo: “Na primeira viagem de ônibus sozinha, de Belo Horizonte a Juiz de Fora, com sete, oito anos, fiquei olhando as montanhas e me perguntando: o que tem lá atrás? Depois vieram o camping, as cachoeiras e o mosquito do montanhismo me picou”. As trilhas de longo curso fazem parte de uma diretriz federal [Portaria 407, editada em conjunto pelos Ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima e do Turismo e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio], que visa fomentar a estruturação de corredores ecológicos e atividades de turismo de natureza, gerando renda para comunidades situadas em áreas biologicamente sensíveis. No Brasil, o conceito ganhou força nos últimos anos, tendo como marco a inauguração da Transcarioca, em fevereiro de 2017. Outras diversas iniciativas em andamento contribuíram para a instituição da Rede Nacional de Trilhas de Longo Curso e Conectividade.
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