Reflexões cotidianas sobre a vaidade e seus exageros - Rede Gazeta de Comunicação

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Reflexões cotidianas sobre a vaidade e seus exageros

Gregório José

Jornalista/Radialista/Filósofo

Imagine-se na frente de um espelho. O que você vê? É apenas o reflexo de um corpo ou há algo mais por trás da superfície de vidro? A vaidade, companheira inseparável de nossas manhãs diante do espelho, pode ser tanto uma aliada quanto uma traiçoeira adversária.

Na medida certa, a vaidade é como aquele salpicado de sal que realça o sabor de um prato; ela nos motiva a cuidar de nossa aparência e saúde, proporcionando-nos um senso de bem-estar e autoconfiança. Mas, como bem sabemos, até o sal tem seu limite antes de transformar uma refeição saborosa em algo intragável.

Quando a vaidade ultrapassa o ponto saudável, torna-se uma obsessão. Aqui, adentra-se o terreno perigoso da vigorexia, também conhecida como Síndrome de Adônis ou Transtorno Dismórfico Muscular. Não, não estamos falando do Adônis da mitologia, tão belo que fazia todos se apaixonarem. Falamos do Adônis moderno, que passa horas incontáveis na academia, aumentando a carga dos pesos, na tentativa insaciável de se aproximar de um ideal inalcançável de perfeição corporal.

A vigorexia, uma parente próxima da anorexia nervosa, distorce a percepção que a pessoa tem de si mesma. Onde um vigoréxico vê fraqueza e magreza, um observador comum vê músculos definidos e força. Da mesma forma, um anoréxico se enxerga obeso enquanto luta contra a balança e contra espelhos que insistem em mostrar um corpo esquelético.

Então, por que esta incessante busca por um corpo ideal? Com quem, ou com o quê, estamos nos comparando? As revistas de moda, a publicidade, a televisão e até as redes sociais nos bombardeiam com imagens de corpos esculpidos, aparentemente perfeitos. Mulheres de cintura fina, sem um vestígio de celulite, e homens com abdômens definidos e bíceps que parecem esculpidos em mármore. Estes são os heróis modernos, os modelos a serem seguidos, ou, no mínimo, copiados.

O que esses corpos perfeitos realmente nos dizem? São meros cartões de visita ou verdadeiros templos da saúde e da vida? A ironia aqui é rica: muitos desses “corpos ideais” são mantidos a um custo elevado, envolvendo dietas rigorosas, regimes de exercícios exaustivos e, frequentemente, o uso de substâncias nocivas como anabolizantes. Parece que, em nossa busca por saúde e beleza, estamos dispostos a sacrificar exatamente o que estamos tentando preservar.

O narcisista moderno desloca seu senso de identidade para sua imagem refletida, vangloriando-se não do verdadeiro eu, mas de uma projeção idealizada. Imagine Narciso, o personagem da mitologia grega, inclinado sobre um lago, enamorado de sua própria imagem. Agora, substitua o lago por um espelho de academia e você terá uma imagem bastante precisa de muitos frequentadores de academias hoje em dia.

Por que nos impomos a tirania de querer ser como aqueles que parecem nunca envelhecer, nunca engordar, nunca ter um fio de cabelo fora do lugar? Será que algum dia vamos admitir que a verdadeira perfeição reside em nossas imperfeições? Ou vamos continuar a nos flagelar com dietas de folhas e regimes de exercício que nos transformam em versões mais musculosas de Sísifo, empurrando eternamente a rocha da perfeição corporal colina acima?

Na verdade, cuidar da aparência e manter-se em forma não é apenas normal, mas saudável. Estes são atos baseados no cuidado de nosso self, um reflexo do respeito por nós mesmos. A vida não é uma eterna passarela de moda, nem uma competição incessante de fisiculturismo. Para aqueles que ainda se encontram presos na armadilha de buscar incessantemente o corpo perfeito, talvez seja útil lembrar as palavras de Oscar Wilde: “A beleza é superficial, mas a feiura vai até o osso.” Então, da próxima vez que você se olhar no espelho, talvez seja mais sábio sorrir para a pessoa que você vê, mesmo que ela não se pareça com o último modelo da revista. Afinal, um sorriso genuíno tem o poder de iluminar qualquer reflexo.