SAMUEL HANAN
Engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário, e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002)
Vivemos sob uma ideologia nascida em contraposição aos erros do passado, que preconiza a intocabilidade dos recursos naturais do solo e subsolo amazônico. Consolidou-se a sensação de que o povo amazônida é o único responsável pela manutenção do bem-estar do planeta. Dele exigem-se enormes sacrifícios para benefício mundial, dando-lhe muito pouco em troca, condenando-o a uma vida pobre e sem perspectivas.
O Brasil precisa fazer a sua parte, combatendo o desmatamento, a exploração ilegal e o contrabando de madeira e de recursos minerais, controlando a pecuária expansiva e estimulando atividades econômicas sustentáveis como o ecoturismo, a exportação de peixes e frutas exóticas, gerando e comercializando créditos de carbono, tornando a população amazônida parceira na conservação da floresta e na divisão dos resultados econômicos, de forma a lhe proporcionar vida mais digna. Em artigo escrito juntamente com o jurista Ives Gandra e publicado em janeiro do ano 2000, já havia um sério alerta sobre isso. No entanto, mais de duas décadas depois, constata-se que nada foi feito para dar nova perspectiva de vida para o povo da floresta, para os indígenas, para os ribeirinhos, para a população do Amazonas, garantindo também o desenvolvimento sustentável da região.
Todos os governantes do País após a promulgação da Constituição de 1988 ignoraram solenemente a Amazônia. Recusaram-se a seguir os exemplos dos presidentes Juscelino Kubitschek (criação da Zona Franca de Manaus) e Castelo Branco (“Integrar para não entregar”), ambos com metas bem definidas para a região. Ademais, não entenderam que é impossível preservar a Floresta Amazônica apenas com palestras, conferências, entrevistas, decretos, leis e polícia.
Mais do que debates e discursos, a floresta e toda a região na qual está inserida, com seus 3,88 milhões de km² e mais de 18,6 milhões de habitantes, requerem políticas públicas, planejamento e visão estratégica, sem a miopia embaçante que já atravessa décadas.
Em nada contribui para a preservação amazônica a manutenção da concentração econômica no Sudeste e Sul do País, alimentada com renúncias fiscais da União que beneficiam as regiões mais desenvolvidas e deixam à mingua as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, cada vez mais dependentes das transferências do Fundo de Participação dos Estados e do Fundo de Participação dos Municípios. Situação agravada pela recente decisão do governo de reduzir o IPI, com consequente queda de receita para estados e municípios e perda de competitividade das empresas do polo industrial de Manaus.
É imprescindível o respeito à vontade dos constituintes que formalizaram ser “mantida a zona franca” e garantidas e preservadas as vantagens comparativas à região.
São intoleráveis a falta de visão, a negação da Constituição, a ausência de plano de governo, federal e estadual, definindo mudança da matriz econômica de modo a reduzir a absurda dependência dos incentivos fiscais federais e inserir a população de todos os 62 municípios do Estado do Amazonas, condenados pelas atrofias demográficas e econômicas do Brasil, responsáveis por fazer dos habitantes da Amazônia cidadãos de segunda classe. Tudo acentuado pela perseguição preconceituosa e permanente contra a Zona Franca, Estado do Amazonas e não a favor do Brasil.
Joe Biden enxergou o caminho. Abriu uma picada na mata fechada em busca da saída de um problema que não é somente brasileiro, mas cuja conta recai apenas sobre nós. Finalmente, a comunidade internacional parece começar a entender que exigir a preservação a custo zero não funcionou e que os países ricos e desenvolvidos do G7 precisam pagar ao Brasil pela conservação da floresta amazônica, com base na totalidade da área preservada, e não de forma parcial. Que os deuses da floresta ajudem o presidente norte-americano a sensibilizar outros líderes mundiais.
Compartilhe isso:
- Clique para compartilhar no Twitter(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Facebook(abre em nova janela)
- Clique para imprimir(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no LinkedIn(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Telegram(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no WhatsApp(abre em nova janela)