GIRLENO ALENCAR
O prefeito Humberto Souto vetou o Projeto de Lei 75/2021, que proíbe a realização de tatuagens e implantação de piercings em animais domésticos e silvestres em Montes Claros, com a alegação de inconstitucionalidade em razão de flagrante vício de competência, bem como vai de encontro com o interesse público. Ele lembra que prefacialmente, não desconhece a importância da matéria, que a norma tem por escopo a importante proteção da fauna e a promoção da saúde animal, proibindo sua submissão a procedimentos não essenciais que podem caracterizar maus tratos, bem como causar-lhes sofrimento, especialmente mediante a realização desnecessária de procedimentos capazes de lhes gerar sofrimento desnecessários. “Vale mencionar que não se desconhece que em outros Estados e Municípios da federação a existência de projetos e até mesmo leis, sobretudo considerando a reprovável tendência, em outros países, voltadas para realização de tatuagens e implantação de piercings em animais de estimação tão só para satisfazer preferências estéticas, causando dores inúteis nos bichos.
É o caso do Projeto de Lei Estadual Ordinária Paranaense, que versa sobre a mesma temática, “além do sofrimento causado pela dor, os animais tatuados são expostos a diversas outras complicações, como reações alérgicas à tinta e ao material utilizado no procedimento, infecções, cicatrizes, queimaduras e irritações crônicas”, o que ensejou a propositura de vedação de tais práticas direcionadas à exclusiva finalidade estética. A esse respeito, não se pode olvidar que o artigo 225 da Constituição da República estabelece que em seu conjunto de princípios e regras “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essência à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, a este incumbindo o dever de “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”.
É dever do município de adotar medidas de proteção e promoção do meio ambiente, e da fauna de modo específico, realizando-se ações que evitem a exposição dos animais a maus tratos, à crueldade e ao sofrimento. Entretanto, cabe destacar, da minuciosa análise das competências constitucionais concorrentes, em sentido lato, que o constituinte demarcou uma área de competências exercitáveis conjuntamente, em parceria, pelos integrantes da Federação, segundo a observância de regras preestabelecidas. Desse modo, no artigo 23, da Constituição da República, restou individualizado as competências gerais ou de execução cometidas à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e, no artigo 24, competências legislativas atribuídas à União, aos Estados e ao Distrito Federal. Adiante, no artigo 30, inciso II, a Constituição da República dispôs ainda sobre a competência legislativa concorrente para nela integrar os Municípios.
Portanto, a competência material comum não se confunde com competência legislativa concorrente. A proposição sob análise se enquadraria, em tese, na competência municipal para legislar sobre o assunto de interesse local e suplementar a legislação federal e estadual no que couber, nos termos garantidos pelo artigo 30, incisos I e II, da Constituição da República, repetida por simetria pelo artigo 15 da Lei Orgânica de Montes Claros. “Contudo, a propositura legislativa, ora apresentada por esta Casa de Leis, deu-se de forma absolutamente abrangente, com vedações de alcance irrestrito. É dizer: o texto adotado na redação da propositura legislativa em questão, que não goza de nenhuma restrição de abrangência, uma vez sancionado, ensejará conflitos no manejo de animais, inclusive no setor de produção, de peculiar interesse econômico, sem prejuízo de provocar conflitos a procedimentos semiológicos, zootécnicos e profiláticos”.
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