Passeio com a Chica - Rede Gazeta de Comunicação
Passeio com a Chica

Isabel Lôpo

Historiadora, atriz, cronista e acadêmica de jornalismo

Certo dia, precisei falar pessoalmente com minha amiga Viviane, que me convidou para um passeio ao fim do dia. Estava em sua porta no horário combinado, quando percebi que teríamos outra companhia.

Viviane apareceu na sala e bastou balançar o objeto que segurava em sua mão direita para que a Chica se levantasse e fosse rapidamente ao seu encontro. Parecia ter consciência da importância daquele objeto e aos pés de sua melhor amiga, manteve a postura ereta e pescoço alongado para receber sua coleira. Até que ela tentou disfarçar sua alegria em ir para rua, mas seu balançar de rabo a entregou.

Ao longo do caminho, Viviane conseguia ouvir meus desabafos e ao mesmo tempo cuidar de sua cachorra, de forma que as vezes os assuntos se misturavam e por isso sorriamos gargalhando.

De repente a Chica ficou séria, levantou o olhar para sua dona e num quase caminhar de ré, arrastou as patinhas para trás como quem quisesse se afastar. Com o afrouxamento de sua guia, fez que ia fazer xixi mas era só uma ameaça e abaixou a cabeça como quem busca concentração para uma tarefa de cunho sensível.

Um feixe de luz vindo do poste mais próximo, poucos segundos em silêncio e ela urina naturalmente, olha para seu feito, cheira com afinco e se exibi como quem quer mostrar o poder de uma conquista. Volta a brincar com seu ossinho, correndo pra lá e pra cá, até parar num canto e com as patinhas cruzadas uma sobre a outra e olhar meio distante, parecia refletir sobre suas aventuras.

Sempre que me atrevia a dialogar e chamá-la por seu nome, a cadelinha balançava levemente a cabeça e voltava a repousar sobre as patas alongadas. O que estará pensando? Será o mesmo que eu? Acredito que o que inicialmente a deixou inibida na hora do xixi, foi a voz diferente pronunciando seu nome, já que havia cumprido à risca a quarentena imposta pela pandemia que atravessamos e há meses não ouvia outra voz pronunciando seu nome a não ser a voz de seus donos.

Ao chegar em casa, me dei conta de que minha amiga me ajudara muito mais, ao levar a Chica conosco do que se estivéssemos sozinhas. A honestidade do olhar canino esclareceu tudo a meu redor.

Deixe comentário

Seu endereço de e-mail não será publicado. Os campos necessários são marcados com *.

%d blogueiros gostam disto: