Os bastidores do 6 de fevereiro de 1930 em Montes Claros: memória e história (Parte 3) - Rede Gazeta de Comunicação
Os bastidores do 6 de fevereiro de 1930 em Montes Claros: memória e história (Parte 3)

MARIA DE FÁTIMA GOMES LIMA DO NASCIMENTO

Professora Doutorado Departamento de História da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes

Dessa forma, os discursos da imprensa opositora à Aliança Liberal em 1930, trataram de construir, socialmente, o 6 de fevereiro de 1930 em Montes Claros – MG. E esses mesmos discursos atribuíram os acontecimentos ao casal Dr. João Alves e D. Tiburtina como mandantes da chacina. Afirmar que o grupo começou o confronto seria uma tarefa para futuras pesquisas, uma vez que o Processo-Crime aponta como réus os opositores do Partido Conservador local e seus correligionários.

Tal processo menciona os nomes que formavam a liderança da Aliança Liberal, seus depoimentos, apontando os réus (todos homens), sem sequer citar D. Tiburtina na lista, nem como participante, muito menos como mandante da chacina. O processo apura apenas os fatos, sem atribuir mandantes. Vale lembrar que, em 1930, terminada a chamada “Revolução de 1930”, o processo foi arquivado.

Esse processo encontra-se sob a custódia da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), na DDIR, junto com os demais processos do Fórum Gonçalves Chaves. As buscas relativas a ele e a outros de interesse de vários pesquisadores acabaram quando iniciamos um trabalho para restaurar a documentação do Fórum Gonçalves Chaves em 2000. Especificamente, o Processo-Crime do 6 de fevereiro de 1930, foi encontrado pela equipe e está completo, na versão original. Trabalhar para restaurá-lo foi prazeroso, por ouvir dizer que havia sido incinerado. No dia que o encontramos, houve muita comemoração, principalmente minha, da Professora Filomena Luciene Cardoso Reis (na época Chefe da Divisão de Pesquisa e Documentação Regional da Diretoria de Documentação e Informação da Unimontes) e dos(as) acadêmicos(as) que faziam parte da equipe.

Em novembro de 1935, Dr. João José Alves faleceu em Belo Horizonte, depois de uma intensa participação política nos pós 1930, tendo sido, inclusive eleito Deputado à Assembleia Nacional Constituinte de 1933, que deu origem à Constituição Nacional, promulgada em 1934. Um brasileiro como poucos, sempre engajado nos problemas nacionais e merecedor do que construiu profissional e politicamente.

Depois do falecimento de Dr. João Alves, D. Tiburtina continuou sua atuação política. Fez admiradores em toda Minas Gerais, dentre os quais Abílio Coimbra (Carangola, 1939) e Angelita Figueiredo (Belo Horizonte, 1950). D. Tiburtina, em meu entendimento, foi uma mulher à frente de seu tempo, zelosa com a política e demandas da sociedade. Assim, D. Tiburtina construiu uma memória e uma história que permanecem vivas e instigantes, ainda hoje (2022), o que nos permite dizer que, em 1930, construíram as representações sociais acerca de sua vida pessoal e política.

Assim, compreende-se que os dois segmentos – memória e história – em se tratando do evento aqui analisado e da própria D. Tiburtina, diferem-se. Na memória local, pululam as narrativas contadas pela população local. E a história oficial – contida nos documentos analisados – desfaz a figura distorcida de D. Tiburtina, uma mulher que ousou adentrar espaços vistos até então como “masculinos”. E, ao adentrá-los, ousou escrever uma nova história que merece ser conhecida e respeitada.

Deixe comentário

Seu endereço de e-mail não será publicado. Os campos necessários são marcados com *.

%d blogueiros gostam disto: