ISABEL LÔPO

Historiadora, atriz, cronista e acadêmica de jornalismo

É o risco; é o preço. Essa era a mensagem transmitida em seu olhar. Depois de receber um aviso, quase em tom de ameaça, vindo de seu possuidor, que disse:

– Se fizer cara feia, apanha mais forte.

Suas articulações doíam cada vez menos, quanto mais engatinhasse pela casa.

A vida da Chica estava cada vez melhor, depois da adoção. Deixou de preguiça e passou a visitar todos os cantos dos cômodos de sua nova residência. Seu nível intelectual elevou-se de um modo, tornando-se visível através de sua educação e comportamento. Bastou seu dono dizer apenas uma vez. Ele chamou-a, acarinhou sua fuça e disse num tom de voz bem suave:

– Nada de bagunça. A partir de agora, beber água só na tigelinha, e xixi no hidrante de seu tapetinho.

Disciplinada, Chica volta babando de satisfação por sua obediência e aguarda, a um passo, até que ele a toma pelos braços e dizendo palavras elogiosas, acomodando-a em seu colo.

Orgulhoso por possuir uma cadela tão diferenciada quanto aquela, vão juntos para a cama ainda com brincadeirinhas que só são permitidas, devido ao nível de cumplicidade entre ambos.

De conchinha, finalizam juntos aquele dia em que viveram apenas um em função do outro, não importando a diferença entre o grau de autoridade entre eles. Quem obedece também possui autoridade suficiente para exercer tal função e que o bichinho peludo parece ter consciência disso, tanto quanto de como é cumprido seu rabo.

Encantada com aquelas cenas, pude observar do meu canto, calada e quieta, o quão interessante é a relação entre os humanos e seus animais de estimação.

A relação cresce com o dia a dia. Esforçam-se para concluírem suas tarefas diárias e dedicam seu tempo para passarem juntos um pouco mais, e se entenderem. Assim, vão se conhecendo e se envolvendo nas preferências da parceria que fizeram, desde quando se encontraram pela primeira vez.

Talvez seja apenas impressão de um olhar externo, mas observei que, ambos estão mais felizes, leves, bem-humorados e acima de tudo, seguros e preenchidos. Existe ali uma relação de confiança, cenas que jamais imaginava assistir com tamanho entendimento, antes de embarcar no avião que me trouxe para as férias na casa dos amigos, Lauro e Viviane, os tutores da Chica.