A adoção de novas cultivares de café pelos cafeicultores brasileiros tem potencial de realizar um salto positivo significativo na produção cafeeira nacional, a começar pelo estado de Minas Gerais, maior produtor brasileiro. A análise é feita por pesquisadores da Embrapa Café e da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) com base nos resultados obtidos em projeto conjunto que está avaliando, em nove regiões cafeeiras do estado, o comportamento agronômico de 16 cultivares de café arábica. Os primeiros resultados estão sendo apresentados em Dias de Campo (vide tabela abaixo), com previsões de colheitas apresentando produtividade acima da média nacional de 26,7 sacas/ha, de acordo com a Conab.
Além de realizar a validação das novas cultivares nas diferentes regiões produtoras, o projeto tem o objetivo de recomendar as que obtiverem os melhores resultados, realizando ações de transferência de tecnologias que também levam ao produtor informações sobre as melhores práticas para o manejo das lavouras.
“As cultivares escolhidas possuem características agronômicas superiores, incluindo resistência a pragas e doenças. Algumas não estão sendo adotadas, ou por não haver ainda resposta de adaptação específica para as diversas regiões cafeeiras, com seus respectivos níveis tecnológicos, ou mesmo pela falta de conhecimento por parte dos cafeicultores”, explicou o pesquisador Gladyston Carvalho, da Epamig, um dos líderes do projeto.
O projeto atual é uma ampliação da mesma proposta realizada inicialmente no Cerrado Mineiro e que, segundo os pesquisadores, obteve grande receptividade por parte dos produtores e que tem modificado o perfil dos cafezais daquela região.
“Os resultados obtidos com o projeto no Cerrado Mineiro, iniciado em 2016, fizeram com que representantes de outras áreas produtivas nos procurassem e que nos levou a instalar, em 2021 e início de 2022, 40 novas unidades demonstrativas. No ano passado, dois anos após o primeiro plantio, com base na nossa observação de campo, tiramos algumas cultivares que não estavam destacando e inserimos outras que foram registradas nesse período. E aí nós plantamos mais 14 áreas”, relata o pesquisador.
Cada unidade demonstrativa será acompanhada por, ao menos, quatro safras. A cada safra, amostras dos cafés passarão por testes de qualidade de bebida, realizadas por Q-Graders, profissionais provadores e classificadores de café certificados pelo Instituto de Qualidade do Café (Coffee Quality Institute – CQI).
As unidades demonstrativas estão implantadas no Norte; Noroeste; Oeste; Centro-Oeste e Sul de MG; no Campo das Vertentes; na Zona da Mata; no Vale do Jequitinhonha; no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, num total atualmente de 39 experimentos, uma vez que o instalado no Vale do Rio Doce foi descontinuado por questões técnicas.
“A cada seis meses visitamos cada uma das unidades demonstrativas, registrando e analisando os resultados das cultivares plantadas. Cada produtor recebeu inicialmente um kit para plantar 100 mudas de cada cultivar, então temos cerca de 1.600 cafeeiros que começaram a produzir, o que tem permitido já realizar avaliações de produtividade”, explana o pesquisador André Dominghetti, da Embrapa Café, que lidera o projeto pela estatal.
Ele explica que, no entanto, a avaliação não se restringe ao quanto as novas cultivares produzem. “Os resultados são diferentes, nas diferentes regiões produtoras, mas em todos os casos temos observado ganhos de produtividade das novas cultivares em relação à testemunha. Para se ter uma ideia, no projeto de validação das cultivares executado no Cerrado Mineiro, algumas das novas cultivares alcançaram ganhos de produtividade acima das cultivares do grupo Catuaí e Bourbon. Soma-se a isso a redução de custo para controle de ferrugem e nematoide, por exemplo, que corresponde a cerca de duas sacas por hectare ao ano”, exemplifica.
O pesquisador analisa que, uma vez que os produtores acompanham ao longo de quatro anos a evolução das cultivares nas condições reais da propriedade, o trabalho de recomendação, que é sempre complexo, exatamente pelas diferenças entre os ambientes de produção, se torna muito mais simples e assertivo.
“Até nós mesmos temos sido surpreendidos pelos resultados obtidos em algumas unidades demonstrativas, independentemente do nível de tecnificação empregado nas propriedades. Acreditamos que ‘ver para crer’ é uma ótima forma de mudar a realidade do cafeicultor para melhor”.
Alessandro Oliveira é diretor técnico do Centro de Pesquisas AP Café e sócio-diretor da AP Agrícola, responsável pela condução das unidades demonstrativas em São Roque de Minas e em Medeiros. Em sua propriedade, o potencial produtivo das novas cultivares estimado pelos pesquisadores varia de pouco mais de 50 sacas para as menos produtivas, o que é considerado um resultado já bastante positivo, até 100 sacas por hectare.
Oliveira explicou que o experimento está sendo conduzido dentro de um sistema de manejo que busca levar as raízes dos cafezais a até 2 metros de profundidade, com o uso de um sistema próprio de gessagem, batizado de Sistema AP Romero, utilizando assim a água disponível no solo.
“Estamos conduzindo os experimentos de acordo com a necessidade do projeto e várias das novas cultivares estão apresentando excelentes resultados. Nós temos, dentro do experimento, materiais que estão se comportando melhor e estão sinalizando que vão produzir muito mais do que o material que eu já plantava aqui”.
“Além disso, eu sofri uma pressão muito grande com o ataque do bicho mineiro. Um material que eu particularmente gosto muito, ele sofre mais com o bicho mineiro. E foi muito interessante, até mesmo visualmente, pois minha lavoura toda sentiu o ataque da praga, mas alguns materiais dentro experimento comportaram melhor. Eles também sofreram o ataque do bicho mineiro, mas não jogaram a folha velha fora. Ficou mais uma vez provado que nós temos que partir para novos materiais”, acescentou o produtor.
Ele cultiva 337 hectares de café. Ele disse ainda que os produtores que participaram do Dia de Campo realizado em sua propriedade, no final de fevereiro, ficaram positivamente impactados com as informações recebidas.
A engenheira agrônoma Kênia Barbosa, técnica de campo do Senar, do Programa de Assistência Técnica e Gerencial (ATeG) Café Mais Forte, atua nos municípios de Raul Soares e Vermelho Novo, na região das Matas de Minas.
Ela conta que quando iniciou seu trabalho na região percebeu que a maioria do parque cafeeiro era bem antigo e que sofria com a falta de água. Assim, viu no projeto uma oportunidade para mudar esse cenário. Buscou a parceria de um produtor local e apoia a condução dos experimentos com as novas cultivares.
Segundo ela, o objetivo é mostrar aos produtores da região as cultivares que estão se destacando agronomicamente, que facilitam o manejo da lavoura e reduzem o custo de produção. “Buscamos ainda aumentar a janela de colheita, pois temos no campo experimental cultivares precoces, médias e tardias”.
E, “a adoção de diferentes tipos de cultivares permite escalonar e ter uma colheita mais longa, principalmente para os produtores de agricultura familiar. Para médios e grandes também é interessante, pois com o maior escalonamento de colheita há maior aproveitamento das máquinas e equipamentos de pós-colheita, sem necessidade de expandir para aumentar a sua produção”, avaliou.
A partir dessa experiência, a intenção dos pesquisadores é transformar o projeto numa ação continuada, em que a cada dois anos, novas áreas e cultivares sejam incorporadas. Eles destacam que os produtores tem sido os grandes parceiros, pois além de ceder as áreas, assumem todos os custos de implantação, manejo e colheita das unidades e disponibilizam toda a mão de obra necessária.
Destacam também o apoio recebido de diferentes instituições públicas e privadas. O apoio financeiro ao projeto é feito pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e pelo Consórcio Pesquisa do Café. Conta com bolsas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Café (INCT Café). “Estamos todos unidos para ampliar a competitividade e a sustentabilidade da nossa cafeicultura”, afirma Dominghetti.
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