BENEDITO SAID
Jornalista, radialista, professor
Montes Claros majestosa.
O nome advém de monte. Do latim mons, môntis, daí amontoado (séc.XVII), amontoamento (séc. XIV), amonto+ar (séc. XIV) de montão. Mas daí vem montanha, montada, “elevação das cambas do freio das cavalgaduras (1844)”: ato de montar (1881), montados e montagem (do francês- 1881- montage), e longe está montanha, surgido do latim vulgar móntánêa.
Montes Claros majestosa está.
Como as palavras que vão se metamorfoseando tempos afora, ganhando significados e significantes, a cidade nasceu formiga, amontou-se em recortes diversos a partir de destemidos desbravadores, bandeirantes inquietos, incertos. Batalhas e nativos mortos, esquálidos, dominados, misturados aos montes de Figueira, forja ativa para criar boi de corte, fazendas, tropeiros, viajantes aos rios e córregos, veredas e buritis, semiárido de fogo e cerrado.
Dominada a seara, começaram a plantar a cidade de hoje. Montes Claros, a majestosa.
Não-princesa. Mulher já madura e talentosa, conhecedora dos vieses da dor e do amor, da orfandade momentânea, a fraternidade constante, cristã e pagã. Folclórica e surreal diante da Catedral de Nossa Senhora Aparecida e que é de Chiquinho Guimarães, o arquiteto genial sem diploma formal que moldou aquele templo e monumento na Praça Pio XII, cuja Cruz vai sendo sobreposta pelos prédios gananciosos pelo céu do capital.
Majestade por elevação e excelência, por pura magnificência. Do latim majetas-âtis. Majestático território dos
Montes Claros.
O tempo arrumou-se em cronometria desajustada para mensurar e fazer o progresso por essas bandas. Trem de ferro chegou tardio, 1930, mas foi comemorado e bem registrado na ponta dos tiros no confronto político marcado pela personagem forte de Dona Tiburtina e o tísico Dr. João Alves, tempo do Partido de Cima e o Partido de Baixo. A guerra atravessou fronteira, Montes Claros foi chamada de terra dos Bugres, Getúlio Vargas em Batalha pelo poder, Washigton Luiz deposto, Coluna Prestes a espreitar seus territórios.
Antes do trem tudo se ajeitava-se no lombo do burro. Desde abrir estradas e até mesmo trazer mercadoria, muitas das vezes descendo pelo porto Salgado, hoje Januária, mas, e principalmente surgindo do Vale do Jequitinhonha, a partir de Araçuaí.
Teve escravidão e derramamento de sangue norte de Minas afora, principalmente no domínio dos nativos, enquanto catrumanos eram na verdade escorraçados e arredios. Maria da Cruz era analfabeta e cruel. Matias Cardoso mais lenda do que vida.
Montes Claros cresceu incólume. Demorou a ter água encanada e luz elétrica. O grande penar era para estudar. Curso superior apenas para elite. Daí começaram a raciocinar sobre o que fazer. Veio a Fundação Luiz de Paula (década de 1960), Fundação Norte-mineira de Ensino Superior, com cursos pagos, Unimontes. Luta e mais luta.
O ensino superior foi fundamental para a cidade crescer, mas sem os incentivos da Sudene, numa época bem distante, e financiamento, muitas vezes desviados dos reais objetivos, nada teria ficado em pé por essas bandas.
O que sustentava até então era, e tão somente, a agropecuária, povo que mantinha raízes de pau-preto, pequizeiro, imburana e aroeira de beira de rio, tudo misturado no mesmo sangue comum aos pertinazes.
O tempo que um dia foi devagar, depois se apressou. Trouxe também seus percalços, como drogas, violência, atropelos sociais, transformações comportamentais, fugindo daquela tradição de nome e sobrenome. À medida que mais ruas surgiam, mas desconhecidos chegavam para trabalhar, estudar, moldando uma metrópole que hoje se comporta como cidade diversa e diversificada, multicolorida, com neon, apagões e reconhecimento pela arte e cultura, batuques de agosto, ventos do montesclareou, Tino Gomes e Georgino.
Por aqui, em forma majestática, respira-se vida. Infraestrutura de Humberto Souto e Toninho Rebelo, música de Dulce Sarmento, João Chaves e Beto Guedes. Violão de seu Ducho, artista Godofredo Guedes que “sempre nos faz recordar” para aprender com o passado, jogar luz no presente e moldar o futuro.
“Se numa noite eu viesse ao clarão do luar /Cantando e aos compassos de uma canção /Te acordar /Talvez com saudade cantasses também /Relembrando aventuras passadas / Ou um passado feliz com alguém/ Cantar quase sempre nos faz recordar /Sem querer Um beijo, um sorriso, ou uma outra ventura qualquer /Cantando aos acordes do meu violão / É que mando depressa ir-se embora saudade que mora no meu coração.”
Montes Claros, essa majestade de trono de madeira, cerne puro, aroeira de beira de rio. Raiz e profundidade. Árvore frutífera, mesmo em tempos de sequidão bravia. Vamos em frente. Olho no retrovisor e visão para o amanhã, clarear.
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