A grande mudança na relação fisco e contribuinte em 2020 - Rede Gazeta de Comunicação

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A grande mudança na relação fisco e contribuinte em 2020

SILVANIA TOGNETTI

Advogada tributarista

É preciso reconhecer que o contribuinte é o grande herói da arrecadação, porque ele é quem faz existir o que será arrecadado. O setor público não produz riquezas que possam ser tributadas, apenas o setor privado faz isto. De outro lado, os agentes arrecadadores do Estado são os heróis da sociedade, pois, sem eles, não existiria a maior parte dos recursos públicos que permitem a atuação do Estado na sociedade. O cumprimento de obrigações fiscais quase nunca se daria de forma espontânea. Enfim, esta relação fisco-contribuinte é simbiótica, um não vive sem o outro.

E é por essa razão, de relação simbiótica, que 2020 marcou o início de uma nova história: a possibilidade prevista em lei do diálogo entre contribuinte e fazenda pública na busca de soluções para permitir a arrecadação de tributos em atraso sem impedir a continuidade das empresas. É o ano em que se iniciam as transações tributárias.

Presente no Código Tributário Nacional desde a década de 60, a transação tributária esperou mais de quatro décadas para ser regulamentada em lei e apresentar-se como útil e eficaz para a sociedade. Uma pena! Poderíamos estar bem mais avançados nas formas de arrecadação eficiente de receita tributária.

A Lei 13.988, de 14 de abril de 2020, trouxe, finalmente, a possibilidade de celebração de transações entre Procuradoria da Fazenda Nacional e os contribuintes. O objetivo é permitir que o contribuinte possa reunir toda a sua dívida com a fazenda pública federal e apresentar um plano para liquidação com algum desconto, mas principalmente um racional de pagamento da dívida coerente com os seus limites financeiros. Embora também preveja a transação por adesão, nosso foco aqui são as transações individuais aquelas que trazem uma nova forma de soluções de conflito para o passivo tributário.

Isso, porque, na transação por adesão, a fazenda pública apresenta um conjunto de condições para pagamento com o qual o contribuinte pode aderir permitindo uma solução para o seu passivo tributário. É iniciativa da Fazenda Pública que deixa pouco espaço para a individualização do caso de cada contribuinte. Mas, para os contribuintes com passivo tributário acima de 15 milhões de reais é possível a transação individual, perfeito exemplar da aproximação entre fisco e contribuinte, onde o contribuinte apresenta seu plano para quitar a dívida, como devedores fazem ao tentar renegociar seus débitos privados com seus credores. Em nome da transparência as transações são públicas e podem ser consultadas no site da Fazenda Nacional. Vale ver que estamos avançando.

Ainda há muito para evoluir em matéria de transação tributária. A meu ver, um dos principais pontos é o estabelecimento de um prazo máximo de 84 meses para o encerramento das obrigações transacionadas. Diante da realidade do endividamento dos contribuintes e quando comparado com o que vemos no caso de dívidas privadas, é um prazo ainda pequeno, o que torna as prestações muito altas. Na alteração recente da Lei de Recuperação Fiscal, há previsão de prazo maior para entidades em recuperação judicial, 120 meses, o que já melhora um pouco, mas o ponto fundamental é que o prazo deveria ser o resultado de uma análise do valor da dívida e da capacidade financeira, o que pode exigir prazos mais longos.

O ano de 2021 (e talvez os próximos também) serão muito difíceis para a economia. Ainda não é possível saber as consequências da pandemia e sequer avistar quando ela estará sob controle. Muitas empresas não sobreviverão e outras mais precisarão de muita ajuda para superarem o momento. Será uma boa oportunidade para testar o diálogo e ampliar ainda mais o leque de contribuintes que possam acessar as transações individuais.