O que muda com a regulamentação das criptomoedas no Brasil - Rede Gazeta de Comunicação

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O que muda com a regulamentação das criptomoedas no Brasil

PATRICIA PECK

Advogada, Conselheira Titular do Conselho Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e Professora da ESPM

LORENA BOTELHO

Advogada e especialista da área de Societário, Contratos e Inovação

Novas leis costumam refletir as necessidades da sociedade e têm como objetivo acompanhar as transformações das relações, de modo a garantir maior segurança jurídica e inclusive gerar novas oportunidades. Na atual conjuntura digital, significa atrair mais investimentos e até estimular o desenvolvimento de inovações.

Um dos avanços mais importantes que tivemos neste ano foi o “Marco das criptomoedas”, com a aprovação do PL 4401/2021 (antigo PL 2303/15), que regulamenta o mercado de criptomoedas, com definição de ativos virtuais, prestadoras e do crime de fraude com com utilização de criptoativos e suas penas. O texto foi sancionado pela presidência e publicado no Diário Oficial da União no dia 22 de dezembro, e passa a valer em 180 dias.

Isso coloca o Brasil num patamar privilegiado, já que o mercado aquecido com os ativos virtuais exige maior preparo e precisa alcançar a atualização. Ficou para o próximo governo a definição de qual será o órgão regulador, mas a expectativa é que o Banco Central assuma a função, e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) seja responsável pela regulação da parte de investimento.

Ainda em dezembro, o Bacen publicou a resolução 273 que criou o Grupo de Trabalho Interdepartamental (GTI) sobre “tokenização”, para analisar e propor ajustes regulatórios na custódia, registro, negociação e liquidação de ativos financeiros que usam blockchain. Já em outubro, a CVM publicou o Parecer 40, com caráter de recomendação e orientação, que estabeleceu que a tokenização não está sujeita à prévia aprovação ou registro, mas emissores e a oferta pública de tokens ficam sujeitos à regulamentação aplicável.

São medidas motivadas pela aceleração dos movimentos globais de regulação das criptomoedas. No caso do PL 4401/2021, é possível dizer que o foco foi a proteção ao investidor e a integridade do mercado – e não os ativos digitais em si. Até porque a natureza descentralizada das criptomoedas impõe dificuldades para que legisladores tanto no Brasil quanto no exterior consigam chegar a um consenso sobre a forma adequada de regulá-las sem criar entraves à inovação.

Outra análise é que se trata de um texto generalista, que não vai a fundo em exigências, mas que agradou por ter sido retirada a proposta que determinava a segregação patrimonial. Este era o ponto mais controverso do PL, e que foi deixado para ser regulado posteriormente, como forma de viabilizar a votação do projeto como um todo.

Conforme surgem novos recursos e modalidades de pagamentos e de transações, aumentam os desafios para diferentes setores do mercado. É um avanço bastante importante, quase uma evolução natural da incidência da tecnologia sobre o sistema financeiro. A principal questão é como estipular esses mecanismos de controle sem impedir a evolução tecnológica que marca os criptoativos, mas a grande evolução é trazer maior transparência sobre o que é feito nessas operações.

Um exemplo recente foi a quebra da gigante FTX, uma das maiores corretoras de criptomoeda do mundo, que espalhou uma crise no ecossistema de criptos e ativos digitais. As avaliações iniciais indicam que o dono, Sam Bankman-Fried, não foi transparente com suas operações na companhia. Um critério primordial para manter a sustentabilidade no sistema financeiro.

O Brasil precisa investir em inovação e avanços regulatórios para estar na disputa internacional pelas novas indústrias 4.0 e pelos mercados digitais. Mas não pode ser a qualquer custo. O preço a pagar não pode ser o da ética tampouco o da transparência. É preciso conhecer os riscos, assumir as ameaças e ter mecanismos para lidar com os incidentes, tanto por meio de normas atualizadas regularmente como legislações que acompanhem esse fluxo de inovações.