Montes Claros completa 190 anos com “esquecimento” da data - Rede Gazeta de Comunicação
Montes Claros completa 190 anos com “esquecimento” da data

GIRLENO ALENCAR

O município de Montes Claros completou, ontem (16), 190 anos de emancipação política administrativa e faltando 10 anos para completar seu bicentenário oficial, a data continua sendo desconsiderada. No último dia 24 de setembro, o Instituto Histórico de Montes Claros até discutiu o assunto, quando o professor Marcos Fábio Martins Oliveira chamou a atenção para os historiadores. A jornalista e médica Mara Narciso, em artigo também abordou o assunto, onde reforça a data da emancipação e destaca que “quando a cidade fez 150 anos, muitos dos 150 homenageados saíram das ruas que nomeavam para desfilar com seus feitos, mas também havia pessoas vivas, que se podia encontrar nas esquinas. Então, se passou uma década e meia e a cidade fez 165 anos em três de julho. A montes-clarense Milena Narciso cantava: ‘Montes Claros/ Vovó Centenária/ está tão bonita/ de vestido novo’ (Luiz de Paula Ferreira), para explicar que, pintando suas casas, os cidadãos se prepararam para o Centenário”. 

Ela lembra que “o januarense Alcides Alves da Cruz era o ‘montes-clarense’ mais fanático que já existiu. Foi contador, jogava futebol, era amigo de Hermes de Paula, médico e historiador que dirigiu o Cassimiro de Abreu Futebol Clube e foi quem coordenou o Centenário. O nome do Pentáurea Clube, outra criação de Hermes, dizia Alcides, significava cinco bodas de ouro, referentes aos 250 anos da fundação da Fazenda Montes Claros (1707 a 1957). Em 1955, depois de aprofundada pesquisa, Hermes da Paula descobriu dados sobre a Sesmaria recebida por Antônio Gonçalves Figueira em 1707, que ‘afazendou-se’ na Fazenda Montes Claros e os cem anos de cidade a serem comemorados em três de julho de 1957. Sabia que a emancipação ocorrera em 13 de outubro de 1831 – instalação da Câmera Municipal em 16 de outubro de 1832, e que o centenário de vila já havia sido comemorado. O escritor Haroldo Lívio escreveu sobre o ‘Inventor do Centenário’ falando da elevação a cidade em 1857”.

Os preparativos do Centenário duraram dois anos. Uma obra importantíssima de 600 páginas e contendo as duas datas foi escrita por Hermes de Paula: “Montes Claros, sua história, sua gente e seus costumes”, sendo a mais pesquisada e citada em âmbito acadêmico; foi construído o Colégio Marista São José e o Parque de Exposições João Alencar Athayde; aconteceram avanços urbanísticos e uma arrancada civilizatória.

Juscelino Kubitscheck, presidente da república e Bias Fortes, governador de Minas Gerais vieram ao evento. O prefeito de Montes Claros era Geraldo Ataíde. A cidade não tinha hotel para hospedar essas figuras ilustres, que ficaram nas casas dos organizadores. A festa constou de desfiles, representações folclóricas, rodeios, cavalhadas, leilões de gado, inaugurações, baile de gala e muitas promessas.

Hermes de Paula convidou Maria Inez Narciso, então aluna do Grupo Escolar Gonçalves Chaves para abrir o desfile de rua vestida de formiga. Maria do Rosário de Souza Narciso, sua mãe, confeccionou sua roupa que constava de um solidéu com antenas no alto da cabeça, um colete prateado com mangas armadas, uma blusa preta de mangas compridas, calças compridas justas e sapatos pretos. Portava um bastão nas mãos e fazia piruetas ensinadas pela sua professora. Formada em Pedagogia, anos depois, Maria Inez foi diretora da Escola Estadual Antônio Gonçalves Figueira, o fundador da cidade.

A comemoração do Centenário trouxe expectativas, mas o crescimento só chegou na década de 1970, com a industrialização, isenção de impostos proporcionada pela SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste e o asfaltamento da rodovia para Belo Horizonte.

Há falsas polêmicas sobre as datas comemorativas do município. Antônio Gonçalves Figueira, da Bandeira de Fernão Dias Paes, obteve em 1707 a sesmaria de uma légua de largura por três léguas de comprimento, nas cabeceiras da margem esquerda do Rio Verde Grande, mais tarde Fazenda de Montes Claros, maior centro comercial de gado do Norte de Minas. O Arraial de Formigas ampliado no entorno da capela construída por José Lopes de Carvalho tornou-se Arraial de Nossa Senhora da Conceição e São José de Formigas, que depois, unindo-se à Fazenda Montes Claros emancipou-se, formando a Vila de Montes Claros de Formigas e, por fim, a Cidade de Montes Claros (1857). O nome é referente a uma serra clara de xistos de calcário e pouca vegetação, serpenteando o local. O nome Formigas anexado a Montes Claros durou 25 anos, mas Arraial de Formigas fixou-se, por tradição histórica, como nome primitivo de Montes Claros. Saiu de cena o formiguense, estabelecendo-se o montes-clarense.

De 2017, o livro “Montes Claros: Memórias do Centenário” de Rogério Othon e Luciano Pereira conta as movimentações festivas, com recortes de reportagens, especialmente do extinto jornal Gazeta do Norte e publicações em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro, então Distrito Federal. São mostradas crônicas dos cem anos escritas por Hermes de Paula, Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, Anderson Magalhães, Maria Antônia Alkmim, Haroldo Lívio e Yvonne Silveira. Com estimados 417,5 mil habitantes (2021) e a 422 km de Belo Horizonte, por existir onde está, Montes Claros é o milagre do trabalho do seu povo. Que se possa usar o passado dos vultos desta terra para enaltecê-los, arrancando das suas lutas o estímulo para avançar rumo ao futuro promissor, não para poucos, mas para a maioria da população da cidade.

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